
Por Ana Carolina Wertenberg
O bairro Ipiranga, na Zona Sul de Juiz de Fora, tem crescido tanto que já ocupa a sexta posição entre os mais populosos da cidade, segundo o Censo de 2022. Ao caminhar por suas ruas, é possível perceber que não só a geografia do bairro se expandiu — mas também a forma como ele se entende enquanto comunidade.
As primeiras famílias que se mudaram para os lotes que antes pertenciam a Salvador de Castro agora relatam as mudanças que o tempo trouxe para a área. Falar sobre o Sr. Salvador — como ainda é chamado pelos moradores mais antigos — é lembrar que ele foi o dono de grande parte do que conhecemos como Ipiranga.
A extensão territorial é tamanha que o Ipiranga hoje inclui loteamentos como Ipiranguinha, Jardim Bela Aurora, Estrela Sul, Alta Vista e Arco-Íris, todos integrados à sua delimitação oficial, segundo dados da Prefeitura. Mesmo que esses outros loteamentos façam parte do território do Ipiranga, há, entre os moradores, a percepção de que o bairro (como identidade) se delimita entre as duas principais vias: a Av. Darcy Vargas e a Rua Bady Geara, e todas as adjacentes que se entrelaçam entre elas até a divisão com os outros bairros: Arco-Íris, Jardim de Alá, Santa Efigênia e Bela Aurora.
Para Wellison Antonio Moreira, de 37 anos, que nasceu e cresceu no bairro, a infância é lembrada com carinho, compartilhada com vizinhos que se tornaram seus amigos. “As brincadeiras eram todas na rua, muito diferente de hoje em dia. Brincávamos de bolinha de gude, papagaio, pique-pega, corrida de tampinha. Essas eram as brincadeiras da época. Os meus amigos são todos os meus vizinhos, desde a Rua Nelito dos Santos Nazareth até a Rua Elmaia Cunha. Nós nos reuníamos na parte da Elmaia Cunha que a gente chama de viradouro e sempre brincávamos ali.”
É na Av. Darcy Vargas que se encontra o coração do bairro, com comércios, a praça, o posto de saúde e o Centro Comunitário, onde por muito tempo funcionou a única igreja católica da região. Mas não foi desse ponto que o bairro se desenvolveu, e sim da Rua Raul Corrêa Castro. É nessa rua — que muitas vezes passa despercebida pelos próprios moradores — que fica localizada a fazenda de Salvador de Castro. Foi a partir daquele ponto, com a venda de lote após lote, que famílias buscando se firmar criaram a comunidade do Ipiranga.
Para Wellison, que viu o bairro se desenvolver, as mudanças entre sua infância e sua vida adulta são muitas. “A população aumentou muito comparado com antes. Antigamente, o entorno de onde eu cresci era tudo pasto, não tinha tantas casas. Você via muitos animais na rua, muita vegetação, e agora é basicamente só construção.”
Apesar da perda de áreas verdes no bairro, Wellison diz que isso não foi uma perda total, já que o aumento no número de construções também trouxe coisas boas para a região. “O aumento na construção civil do bairro contribuiu para que houvesse um aumento na geração de emprego dentro do próprio bairro. Com isso, teve um aumento no comércio. Hoje em dia, nas coisas mais básicas que se pode precisar, você pode encontrar dentro do próprio bairro sem precisar recorrer à área mais central da cidade.”
Ao caminhar pelo Ipiranga, é possível notar que, por mais que algumas casas resistam, outras dão espaço a novas construções, menos familiares e com muito menos história. As casas que antes eram mais abertas e receptivas trocaram suas grades decoradas e jardins por muros altos e vigiados por câmeras.
Para Wellison, essa percepção de união dentro da comunidade mudou bastante.
“Os vizinhos antigamente, ao meu modo de ver, eram mais unidos. Acho que a galera tinha mais entretenimento entre si, compartilhava mais sua vivência com o outro. Agora está muito mais individual, hoje cada um faz por si.”
Apesar disso, ainda é possível encontrar aqueles moradores que estão abertos para contar a sua história e a do bairro — de projetos sociais como o Mão Amiga, que ajuda famílias com dificuldades financeiras, assim como outros projetos voltados para ampliar o lazer e aumentar a cultura da população mais jovem.
E é exatamente nesse equilíbrio entre passado e presente que mora sua força como território vivo, pulsante e cheio de histórias para contar. Enquanto os eventos fazem a população aderir a mudanças — para sua própria segurança —, aquele senso de comunidade que começou há mais de cinquenta anos ainda escapa pelas rachaduras dos muros criados, unindo todos em uma só comunidade.
Por fim, Wellison acredita que as pessoas mais jovens do bairro devem entender o ambiente em que moram e ajudar a preservá-lo. “Esse ambiente foi criado do zero. O Ipiranga, ao longo da história, foi se transformando, assim como muitos outros bairros ao redor, que eram fazendas. Então ele foi crescendo, tomando forma. Os jovens têm que se valorizar muito e cuidar do patrimônio e manter para os próximos. Porque quanto mais a gente cuida da nossa casa, mais tempo ela permanece de pé. E quando eu falo casa, aqui eu falo do Ipiranga em si. Então é preservar e cuidar, cada um fazendo a sua parte para que o nosso bairro possa permanecer e crescer cada vez mais.”